segunda-feira, 15 de julho de 2013

 Estamos chegando na reta final....


Morfema zero – o silêncio que grita

julho 15th, 2013
Daí que eu fui fazer uma porção de morfologia com a Madrasta do Texto Ruim, minha colhéga nas aulas de Morfologia, tá juntando o caldeirão dela por aqui pra gente preparar juntas o que ela chama de poções de morfologia. Mandei um e-mail para a Bruxa cobrando nossa poção..  ♥
Bruxa! Como é que a gente faz a poção do morfema zero?
E ela me respondeu o seguinte:
Num faz, Elaine! Ela é uma poção invisível, com cheiro e gosto fortes pacaramba! Mas tem receita pra não fazer essa poção! Calma que eu explico!
morfemazero

Aí ela encontrou na web esse patinho daí de cima, e achou perfeito pra ilustrar um texto sobre morfema zero. (Essa bruxa é uma tarada, eu hein! Mas ela se empolgou com as explicações sobre o morfema zero, e eu fiquei quietinha no meu canto, só mexendo o caldeirão:)

"Então, vamos ajudar o patinho a encontrar o pinto morfema perdido?

Porque, né? Como estávamos vendo (oi?) porraqui, a morfologia é uma das poucas áreas do
conhecimento humano que gera silêncios escandalosos e significativos.

- Cuméquié, bruxa? Perguntará você. E eu explico:

Vamos comparar as palavras menina e meninas. qual delas está no plural?
- Meninas! – responderá você, lépido e fagueiro.

E eu te pergunto de novo: e como você chegou a essa brilhante conclusão?
- Ah, é por causa do esse no final! Muito bem!

Então, a morfologia explica que o morfema indicador de plural é o {-s}.
Outra perguntinha: como você sabe que menina  está no singular?
- Ih, ah, é… pô, num tem ésse!

Isso mesmo! Então, qual é o morfema que indica o singular em uma palavra na língua portuguesa?
- [ouve-se o cantar de grilos ao longe, graças ao seu silêncio...]

Mas é facim, facim! A brincadeira é assim: se você tem um morfema que passa uma informação, e comparativamente não encontra outro morfema pra marcar uma informação similar (como feminino X masculino; singular X plural; aspectos numeropessoais e/ou  modotemporais comparados entre duas conjugações verbais diferentes – presente X pretérito, por exemplo – etc.), então essa ausência de morfema é chamada de morfema zero.

Ou, como diria Henry Alan Gleason Jr (armaria, como foi difícil encontrar o nome desse cabra, sô!), de forma bem mais pomposa, no livro Introdução à Linguística Descritiva, de 1961:

“pode-se dizer que há morfema zero somente quando não houver nenhum morfe evidente para o morfema, isto é, quando a ausência de uma expressão numa unidade léxica se opõe à presença de morfema em outra.”
Portanto, na língua portuguesa, uma das marcações do morfema zero é o singular. Não tem nada lá na palavra pra te dizer que ela tá no singular, e esse nada significa (Beijo, Ronnie Von!)"

Essa bruxa é doidinha, mas eu gosto dela! :D



          Depois de falarmos de Morfema Zero, vamos falar agora de ALOMORFIA...

O que seria essa linda palavrinha?
Alomorfia é a variação de um morfema no seu significado...

Exemplos--'infeliz" e 'imutável,--
   Tanto 'in' quanto 'i" indicam negação
Como o "i" só ocorre diante de consoantes (L,M e R), "in"será desconsiderada a forma básica.
 Vejamos ainda a diferença entre morfema e morfe,o primeiro é uma entidade abstrata e o se-
gundo,sua concretização .Assim infeliz e imutável, há na verdade um morfema de negação que se realiza através dos morfes "in" e "i".

Facinho né?

Processos morfológicos – ou O kuku do munduruku

julho 15th, 2013
E chegamos (eu, Madrasta do Texto Ruim e você, querido lheitor) à derradeira e mais gargalhante poção de morfologia.
Estamos cá, eu e dona Bruxa, tomando nossos bons drink de Ginger Ale (a receita foi dada pela Bruxa aqui), e gargalhando só de lembrar da aula em que tivemos essa revelação da língua Munduruku. Mas calma que a cerejinha desse bolo só recebe quem chegar ao final do texto! (RÁ!)
Relaxar é kuku! kkkkkkkkkkk

Tudo começou na aula de processos morfológicos. Eu comecie a falar disso no post sobre formas livres, presas e independentes. E a Bruxa, numa das poções de morfologia. Vou me aproveitar da opção de morfologia nº 4 da Bruxa:
“o lance de sair enfiando morfema numa raiz é conhecido como afixação, ou a arte de enfiar afixos. Como você pode perceber, afixo é um termo genérico que define os pedacinhos enfiados em tudo quanto é canto da palavra, mais especificamente:
prefixo (antes da raiz)
sufixo (depois da raiz)
E esses são os lindos dos afixos possíveis na Língua Portuguesa. Pensa que acabou? RÁ! Ainda temos:
infixo (no meio da raiz): /rkeN/ =  esticado; /rmkeN/ = esticar. Nessa língua, o infixo {-m-} é formador de infinitivo.
cinrcunfixo (cerca a raiz pelos dois lados): o exemplo a seguir é o circunfixo {u…es}( = muito), usado na língua falada na Geórgia:
u-lamaz-es = muito bonito 
u-did-es = muito largo
Pensa que acabou a esquisitice de afixo? Pois eu te apresento o primo mais esquisitão da família, o
transfixo (é descontínuo, e atua numa raiz descontínua). Acompanhem essa conjugação verbal. Se não me engano, acho que isso aqui é hebraico:
/sagar/ = ele fechou
/esgor/ = eu fecharei
Se você não acompanhou a doideira, repare que a base desse verbo são três consoantes: /s.g.r/, que significam fechar, e suas conjugações são determinadas por transfixos vocálicos. (Sério que você ainda acha crase difícil?)”
Como eu já disse, adoro essa bruxa doidinha! :D

Mas vamos voltar às explicações sobre os processos morfológicos.
Além dos processos de adição, temos outros três: a reduplicação, a subtração e a alternância.

Vamos deixar a reduplicação por último de propósito.

Então, temos a alternância. E esse trem tem nas conjugações verbais do português. Trata-se da alteração de segmentos da raiz da palavra de forma a alternar informações na raiz. Se você ainda não ligou o nome à pessoa, te dou uns exemplos:
fui/foi     pude/pôde     pus/pôs     fiz/fez      tive/teve
etcetcetcetc.

O inglês também usa muito a alternância. Além de conjugações verbais, a língua de seu William (Shakespeare) também se vale da alternância pra indicar plural:

singular/plural: goose/geese     tooth/teeth     man/men     woman/women
conjugações verbais: see/saw     run/ran     eat/ate     speak/spoke

O penúltimo processo morfológico que vamos destacar é a subtração.
Não vamos nos demorar muito com isso, não. Basta dar o exemplo do português, no qual alguns femininos são formados por subtração de morfemas do masculino, como em orfão/orfã; anão/anã; campeão/campeã.

Pronto? Podemos falar da Reduplicação e da nossa gargalhada na aula de morfologia?

Pois então. Há línguas que usam esse processo para avisar alguma coisa. O reduplicado pode estar antes, no meio ou depois da raiz. E pode-se repetir toda a raiz ou parte dela. O mais comum é subentender a informação que em português é passada com a palavra muito.
Por exemplo: no pidgin  falado na Nova Guiné, lapun significa ‘velho’ – e lapunpun ‘muito velho’.

Depois desse exemplo, eu e a Bruxa decretamos que muito é a palavra mais broxante e sem graça da Língua Portuguesa. E vamos provar!


Mas é importante destacar que a reduplicação transmite quatro tipos de informação:
- Intensidade (tá valendo o exemplo da Nova Guiné);
- Iteração: nda = ‘andar’;     nda.nda  = ‘perambular’   / fa(la) = ‘falar’ ;  fa.fal = ‘tagarelar’
- Distribuição: dosy = ‘dois’;     do.dosy = ‘ambos’   /   bodo = ‘borda’;     bodo.bodo = ‘costa’
(os dois últimos exemplos do crioulo de base portuguesa da ilha de Ano Bom)

E chegamos ao Munduruku. Eis que nossos índios lá do rio Tapajós, no Pará, usam a reduplicação para expressar graus de intensidade de três tipos: duração, intensificação ou atenuação e pluralização.

Aí a professora, sem nos alertar nada, conta pra toda a turma que em Munduruku a palavra Ku significa gostoso; e kuku é muito gostoso.

Pedimos perdão a Ferdinand de Saussure, Noam Chomsky, Marcos Bagno, Dioney Moreira Gomes e todos os linguistas do Brasil e do mundo, e caímos na gargalhada. Porque seriedade e critério científico têm limites. O nosso limite foi o kuku do munduruku.

Ai, desculpa, foi mals! (Aceitam um ginger ale?)